O
FUTEBOL FEMININO NOS ESTADOS UNIDOS
*Por Romeu Carvalho de Castro.
1.)
Aspectos históricos: O futebol feminino
nos Estados Unidos não tem seu sucesso fundamentado na
popularidade desta modalidade desportiva dentre os imigrantes
latinos ou europeus, onde o futebol masculino encontra suas raízes
naquele País. Praticado em sua maioria por garotas brancas,
das camadas mais ricas da população, o futebol feminino
do País Bi-Campeão do Mundo encontra sua base principal
dentro do sistema educacional dos EUA, seja ele publico ou privado.
Preocupados com a valorização do conceito de trabalho
em equipe pelos estudantes, que abusavam da busca de interesses
individuais no cotidiano das escolas, os educadores norte-americanos
passaram a incentivar a prática de esportes e outras atividades
coletivas. O objetivo era demonstrar aos adolescentes que o trabalho
em equipe era capaz de gerar resultados positivos para todo o
grupo, desde que cada indivíduo contribuísse com
uma parcela do esforço necessário para a obtenção
dos resultados pretendidos pelo time como um todo.
Entediadas com o Softball e receosas com a violência do
futebol americano, as mulheres encontraram no nosso futebol (soccer
para os Americanos) a modalidade desportiva mais atraente para
o cumprimento do programa escolar. Iniciado ainda na década
de 70, o programa de futebol feminino dos Estados Unidos permaneceu
restrito ao campo educacional até 1985, quando pela primeira
vez foi formada uma Seleção nacional no país,
reunindo a elite das atletas Universitárias.
A craque Michele Akers, capitã dos Estados Unidos no Mundial
de 99, estava dentre as pioneiras da primeira Seleção
formada no país, e marcou o primeiro gol da história
da Seleção feminina dos Estados Unidos no dia 18
de agosto de 1985, num empate por 2 X 2 diante da Dinamarca.
2.)
A força das Universidades: O investimento cada
vez maior no Desporto Universitário nos Estados Unidos,
alavancou o desenvolvimento do futebol feminino do país.
Mais que isso, propiciou o surgimento de toda uma geração
de craques que garantiu aos Estados Unidos o status de maior potência
mundial na modalidade.
O mecanismo que garante este sucesso é baseado na excelente
infra estrutura desportiva mantida pelas Universidades. As estudantes
que praticam futebol nos Estados Unidos recebem bolsas de estudos
que podem chegar a US$ 35,000 (Trinta e cinco mil dólares)
anuais. Além do incentivo financeiro, as meninas contam
com ótimos campos de treinamento, técnicos especializados,
assistência médica, acompanhamento alimentar e muito
intercâmbio internacional.
O técnico que levou os Estados Unidos ao primeiro título
Mundial em 1991, Anson Dorrance, construiu seu programa a partir
de uma experiência muito bem sucedida como técnico
da Universidade da Carolina do Norte. Lá Dorrance montou
a base daquela que seria considerada a maior equipe de futebol
feminino da década de 90.
Existem atualmente duas organizações regulamentando
o desporto Universitário nos Estados Unidos. A NCAA reúne
as grandes Universidades do País, divididas em duas divisões
gerais, que se subdividem em várias regiões. A NAIA
reúne as pequenas Universidades, contando com apenas uma
divisão. Mais de 300 Universidades possuem programas de
futebol feminino no país. A grande maioria disputa competições
oficiais.
O Campeonato Nacional Universitário promovido pela NCAA
é mostrado ao vivo por cadeias locais de TV e em rede nacional
pela ESPN. Os torcedores pagam ingressos que variam de US$ 5.00
a US$ 100.00. A renovação do grupo de atletas é
garantida por uma rígida regulamentação,
que permite a uma estudante a prática do futebol por apenas
4 anos. Notas baixas podem afastar do time até mesmo a
maior estrela de uma equipe. As Universidades estão constantemente
monitorando as equipes de High School (nosso segundo grau), buscando
as melhores atletas para repor suas peças.
Muitas atletas brasileiras desistiram do sonho de defender a nossa
Seleção para disputar as competições
Universitárias Americanas. A goleira Carol, as alas Daiana
e Débora, as zagueiras Michele e Raquel, a Meia Talita,
e as atacantes Aninha e Camila deixaram a equipe Sub-17 do Saad
em 97 para atender a um convite formulado pela NAU (National American
University), que implantava naquele ano seu programa de futebol
feminino pela NAIA, através so Campus da cidade de Rapid
City. Logo no primeiro ano a equipe sagrou-se Campeã da
Região, e as atletas Carol, Camila e Michele foram relacionadas
para a Seleção Nacional da Competição,
feito nunca antes atingido por uma equipeem seu ano de estréia.
Tal sucesso abriu portas para brasileiros em diversas outras Universidades
daquela região.
3.)
A USISL (ATUAL USL): O grande sucesso do futebol feminino
no ambiente educacional fêz com que se iniciasse um movimento
pela criação de clubes que incentivassem a prática
desta modalidade. A temporada Universitária ocupa as principais
atletas Americanas entre os meses de agosto e dezembro. Rígidas
normas das Associações que controlam o desporto
universitário nos EUA (NCAA e NAIA), proíbem que
as atletas treinem ou joguem pelas Universidades por um período
maior que 7 meses anuais.
Tal norma tenta impedir que as Universidades funcionem como verdadeiros
clubes profissionais, privilegiando a busca de resultados desportivos
em detrimento da educação das atletas. Essa medida
resultou numa lacuna de 5 meses no calendário de competições,
e favoreceu o aparecimento de clubes de futebol feminino, totalmente
desvinculados das Universidades. A principal liga de futebol feminino
nos EUA durante os anos 90 foi a W-League, administrada pela USISL,
com sede administrativa na cidade de Tampa (FL). A liga funcionou
até 1998 com o apoio financeiro da UMBRO, promovendo a
disputa da W-League em duas divisões, que movimentaram
mais de 50 clubes de diversos estados americanos. A filiação
a esta liga ocorre no sistema de franquias.
A temporada da W-league se inicia no mês de maio e atravessa
o verão Americano, encerrando-se em meados de agosto. Como
atletas profissionais perdem a condição de jogo
nos campeonatos Universitários, a maioria das equipes da
W-League são semi-profissionais ou amadoras. Apesar das
restrições impostas pela legislação
do desporto Universitário, os principais clubes da W-League
encontram brechas na lei para garantir às suas principais
estrelas um salário médio de US$ 4,000 (quatro mil
dólares) mensais; algo semelhante com o amadorismo “marrom”
que marcou muitas modalidades Olímpicas do Brasil nos anos
70 e 80.
4.)
WUSA: Os resultados obtidos pela sua Seleção
nos últimos anos fizeram do futebol feminino uma febre
nos Estados Unidos. Campeã Mundial em 91 e 99, Campeã
Olímpica em 96 e Hexa-Campeã da US Cup, Campeã
do I Campeonato Mundia Sub-19 patrocinado pela FIFA, a Seleção
Norte Americana atrai diversos patrocinadores. Além da
Nike, empresas dos ramos alimentício, brinquedos, automobilístico
e eletrônico investem hoje na modalidade. A boneca Barbie
teve uma edição comemorativa lançada às
vésperas da Copa de 99, associada à imagem da jogadora
Mia Ham. O sucesso absoluto nas vendas comprovou a força
das novas estrelas no público infantil. Estima-se que dez
milhões de mulheres participem de torneiros oficiais nos
Estados Unidos na atualidade. Uma cena comum nos parques públicos
das grandes cidades é a presença de mães,
avós e netas reúnidas na prática saudável
do futebol.
O futebol feminino Norte-Americano ocupa expressivo lugar na audiência
dos eventos de TV, e atrai milhares de torcedores aos estádios.
Diante de tal quadro, era inevitável a criação
de uma Liga Profissional, que permitisse às atletas 100%
de dedicação aos treinamentos e jogos durante todo
o ano.
Criada em 2001, a WUSA logo se consolidou coma a principal competição
entre clubes do Mundo, superando logo em seu primeiro ano a tradicional
Liga Italiana, desenvolvida desde os anos 80. Contando com todas
as atletas da Seleção Americana e com jogadoras
titulares das 14 principais Seleções do Mundo, a
WUSA tem jogos de altissimo nível técnico e ampla
cobertura da mídia. A média de salários chega
aos U$ 10,000 mensais, fora os patrocínios particulares
das atletas.
São oito equipes estrategicamente sediados de acordo com
os interesses comerciais da Liga: Atlanta Beat, Boston Breakers,
Carolina Courage, New York Power, Philadelphia Charge, San Diego
Spirit, San Jose CyberRays, Washington Freedom.
Cada clube joga um total de 21 jogos na temporada normal, com
os quatro primeiros classificando-se para os play-offs.
A média de publico pagante na temporada 2002 foi de 7,020
torcedores.
A PAX TV transmite 01 partida por sábado em cadeia nacional,
geralmente aos sábados, cobrindo a um número potencial
de 90 milhões de lares. Redes regionais transmitem as partidas
não escolhidas para a trasmissão Nacional.
As quatro primeiras brasileiras a atuar na WUSA foram a Meia Sissi
(Ex-Saad), e as atacantes Roseli (Ex-Corinthians), Pretinha (Ex-Vasco)
e Kátia Cilene (Ex-Saad). Na temporada 2003 Sissi, Pretinha
e Kátia Cilene estão defendendo o San Jose CyberRays.
A meia Sissi lidera a equipe no campo de jogo, como principal
armadora da Liga, e aos 35 anos consolida sua imagem também
nas obras sociais, fato que tem lhe valido grandes elogios e prêmios
de entidades voltadas às causas humanitárias. Tal
popularidade valeu à craque a presença nas duas
edições do “All Star Game”.
A atacante Kátia Cilene confirma a condição
de artilheira conquistada nos gramados brasileiros desde 1996,
quando ajudou o Saad a Conquistar o primeiro Título Nacional
Invicto da década, sem ter sofrido um gol sequer ao longo
da competição. Kátia foi atleta da Mangueira
e venceu com seu talento a infância pobre e as dificuldades
decorrentes da perda prematura do Pai.